Capítulo 1: A Tempestade

 

Capítulo 1:
"A Tempestade"



Malaquias nunca havia cogitado —seriamente que seu fim chegaria dessa forma.


Sendo odiado desde o começo ao fim de sua vida e por uma coisa descoberta a pouco tempo, foi desprezado pela única pessoa que confiou em si e que não o olhava com desprezo; agora a sua último conversa seria sobre como havia traído todo o mundo, e como o havia enganado com todas as suas mentiras até o fim.


Caindo do mais alto Céu diante do caos que o anteriormente pacífico e calmo Primeiro Piso era, ele se via diante da enorme boca da Besta que se abria mostrando a sua única forma de se redimir. Fechando os olhos e sabendo que mesmo que o que estivesse prestes a fazer agora fosse esquecido pelo mundo ou até mesmo nunca chegassem a saber, ele esperava que ele entendesse e que o perdoasse.


Enquanto chegava cada vez mais próximo de seu fim destinado, o mar gelado do Primeiro Piso fervia e borbulhava ao seu redor. O Alto do Céu antes intocado e firme, agora se desfazia caindo em direção à água, em grandes pedaços de gelo quente que poderiam cair sobre sua cabeça a qualquer instante. 


E nessa visão caótica e apocalíptica podia se ver o último pedaço do continente que flutuava sobre o céu e sob as águas, prestes a cair e perder tudo o que um dia já foi o lar de muitos.


Em algum momento entre a morte e uma voz distante que o chamava, tudo se tornou escuridão.


E um grande clarão surgiu assim que um forte feixe de luz emitiu de seu corpo.


Antes que os eventos que trouxeram a morte de Malaquias fossem possíveis, é necessário que saibamos que tudo teve princípio em um dia quente e comum no Segundo Piso, onde os avisos de uma grande tempestade surgiram nos Céus e trouxeram para si um estranho presente.



__* * *__



Eram duas horas da tarde quando Malaquias percebeu que o horário do almoço já havia se passado e que ele não iria conseguir pegar nenhum peixe mesmo se quisesse pegar um.


A simples força do querer não faria com que algum peixe burro surgisse e mordesse o seu anzol e também,  não encheria o seu estômago vazio. 


Mesmo que ele tivesse o anzol, a vara e um mar enorme lhe faltava técnica e coragem para entrar no mar—coisa que ele não faria nem pago—como qualquer pescador da Vila. 


A algumas horas atrás ele estava sendo instruído pelas únicas crianças da Vila que eram atrevidas o suficiente para demonstrarem coragem de falar com si, crianças que mesmo que tivessem seus poucos doze anos de idade, em poucas horas, conseguiram encher um cesto inteiro, enquanto ele (vulgo adulto) se mantinha a semanas com o cesto vazio.


Era uma imagem deplorável—E vergonhosa—de se ver. Um homem adulto, sentado em uma pedra segurando uma vara por estar com medo de entrar na água.


Como ele poderia viver assim? Pelos Céus, esta é uma Vila de Pescadores, como você não consegue nem pôr o pé no mar?!


E o tempo passou normalmente como sempre, e como até o mar estava calmo como se fosse a própria terra firme, o cochilo de Malaquias teria durado mais se não fosse pelo som de um trovão distante ecoando pelo seu ouvido.


Antes mesmo que pudesse lembrar de como o Sol a algumas horas atrás estava brilhando forte, viu aquele céu cinzento e sombrio que não parecia nada amigável.


Quem vivia no Segundo Piso sabia muito bem o quão comum era ter Grandes Tempestades acontecendo de tempos em tempos; assim como todos sabiam o quão grave era a situação.


Era comum que vilas e pequenas cidades distantes das Capitais e que não possuíssem a proteção da magia ou de Árvores de Pilar acabassem de repente com um sopro  deixando um rastro de devastação pra trás ou sumindo completamente com tudo, quase como se nunca tivesse existido alguém vivendo por lá. 


Os únicos que não conheciam o perigo que era, são somente aqueles que viviam atrás de uma dessas proteções. Essas pessoas nunca sequer chegaram a sentir uma rajada de vento em seus rostos, e quando menos esperassem, estariam esmagados por uma árvore que foi derrubada pelo vento, com um membro distante e sozinho, morrendo longe de onde deveriam estar: em casa.


E Malaquias sabia que se caso não quisesse morrer aqui e agora sendo atingido por um raio ou derrubado pelo vento em direção às pedras, teria que se abrigar o mais rápido possível.


Sua casa ficava muito longe dos Pilares, então nunca houvera tanta proteção, o melhor era se apressar.


Mas antes que seu pé tocasse direito o solo arenoso, um vento forte veio da direção do mar direto na praia, derrubando Malaquias em terra.


Malaquias que estava ocupado demais comendo areia não percebeu que acima do céu, como uma pedra que se choca em água parada, uma luz dourada caia fazendo ondas azuis brilhantes se formarem atrás de si. Sumindo na mesma rapidez em que aparecerá.


● ¿ ● ? ●



Malaquias não havia percebido quanto tempo havia passado desde que tinha sido derrubado pelo vento e também não teria tempo de contar quanto tempo se passou desde que havia acordado, e nem teria como, o caos da Tempestade estava ali.


O vento que ela trazia não era constante; sempre parando por alguns minutos e instantes  para logo soprar novamente com toda sua força. 


Em pouco tempo o que antes era uma linda praia com água esmeralda coberta por pedras e árvores que a rodeavam, agora era a sombra de algo que fora um dia belo.


Todas as árvores que Malaquias conhecia muito bem e eram tão fortes que chegavam a ser uma atividade cansativa ao tentar as cortar, agora tentavam firmemente se manterem em pé contra a tempestade; algumas—sem sorte—se deram ao destino e estavam caídas para a frente, outras quebradas para trás em uma ordem perfeccionista  diante da Tempestade.


Recuperando sua consciência, Malaquias se preparou para levantar e correr, mas assim que deu o impulso sentiu algo prendendo seu pé.


Monstros marinhos, bestas ferozes do fundo dos mares era algo bastante comentado em dias de Tempestade, então a primeira coisa que surgiu em sua mente era exatamente isso.


Um monstro.


E isso foi confirmado quando olhou para o que é que fosse aquilo, se enojado com aquela criatura gosmenta.




A criatura envolvia toda a extensão de sua perna em um abraço gosmento e desconhecido de perigos; seu sapato de couro, seu único par, estava agora dentro do ser que estava próximo de o engolir.


Malaquias em um impulso falho de tentar escapar da criatura, escorrega na areia, mas por sorte do destino ou infortúnio de si mesmo, a única coisa que ficou para trás foi um de seus velhos sapatos.


Com um só dos pés ainda calçados, Malaquias deixou o que é que fosse aquilo à mercê dos Céus; ele não poderia ficar ali nem mais um momento, então correu o mais rápido que podia em direção a sua cabana.


Protegido do caos dentro da proteção de madeira, o homem não havia percebido o tempo passar até que viu o céu limpo.


__* * *__



Malaquias segurava seu chapéu de palha na cabeça  enquanto observava atentamente a praia.


Já estava perto do entardecer quando se esgueirou pela escuridão da floresta a fim de voltar a praia.


Uma brisa suave soprava  fria em seu rosto e tentava furtivamente bagunçar as oferendas que carregava em mãos; Malaquias havia decidido. Ele iria capturar o monstro.


Em sua mente confusa pela queda, o homem havia lembrado involuntariamente de sua infância. Lembrou do pequeno garoto que costumava ser, e também lembrou de quando costumava ser um sonhador.


Antes de ter sido um lenhador, um carpinteiro, um caçador, um artesão...antes de ser um faz-tudo, ele era uma criança que costumava sonhar muito alto. 


Sua 'vovó'—como todos os outros adultos faziam— tinha o costume de contar velhas histórias de acontecimentos passados para ensinar. E sua história favorita era...


"Vovó, a senhora pode me contar aquela história novamente?" 


A mulher que descascava algumas batatas no chão olhou com olhos semicerrados para o garoto à sua frente. A mulher vinha passando por sérios problemas e sua visão já estava quase um completo borrão, mas mesmo que não conseguisse enxergar direito ela podia saber quem era.


Se tratava de Malaquias, o Palha "Queimada"; a criança rejeitada.


O garoto magricelo e sujo se escondia timidamente atrás da porta. Mesmo ferido pelos maus tratos constantes das outras crianças, sua voz mantinha o mesmo tom jovial e gentil de sempre.


A mulher suspirou.


"...pois bem" disse então enquanto continuava sua atividade, "era uma vez…"


Se tratava da estória de uma pequena cria de onça que tinha vontade de viver com os humanos mas não podia por terem muito medo de si. Certo dia ao brincar com sua peteca sozinha na praia, uma tempestade forte começou a soprar ao longe.

Curiosa, a pequena onça olhou para o mar e pôde ver uma estranha movimentação na água. E ajustando a vista para ver melhor, ela havia visto…


"Uma grande besta marinha, como um…como um carnaval na Capital. Né, vovó?" Malaquias havia perguntado a interrompendo no meio da história.


"Haha, sim, está correto...criança" a mulher ria da esperteza do garoto a sua frente.


...uma grande besta marinha, tão grande, mas tão grande que parecia um grande amontoado de bestas menores. A pequena onça logo havia pensado em um grande carnaval, como o que havia visto certa vez na Capital com a sua mãe. 


"Vovó,  a mãe da oncinha era igual a ele?"


"Quê? Oxi, porque não seria? Ela é felpuda e macia como o filho." Coçou a bochecha.


...A pequena assustada, correu imediatamente para a vila dos humanos para avisar que um monstro vinha vindo, mas ninguém a escutava; diziam que o único monstro que viam naquele exato momento era ela ou acabavam fugindo de medo.

Os humanos eram muito pequenos e não podiam fazer nada a respeito, então quando o monstro chegou em sua vila a pequena onça tomou uma decisão…


"E foi assim que a pequena onça odiada, se tornou a amada protetora da vila. Fim." 


Ao fim da história, a mulher já havia terminado de descascar as batatas; agora se ocupando em vários movimentos para circular o sangue nas pernas.


"A senhora...acha que...que a onça ganhou presentes?"


"Muito provavelmente."


"Muitos?"


"Bastante."


"Será que as crianças...as crianças da vila pararam de ter medo dela?"


"Os pais muito provavelmente pararam de contar histórias assustadoras para elas, haha"


"Então sim?"


"Sim."


"...isso é bom"


A senhora sorriu ao pensar no quão boba e inocente era a criança que havia ali.


Ela não podia ver, mas Malaquias sorria aliviado enquanto seu olhar brilhava em olhos marejados.


Malaquias nesse dia havia desejado fortemente encontrar uma besta marinha e isso durou por anos antes que percebesse enfim que seus desejos nunca se realizavam...até o dia de hoje.


Na escuridão da praia uma figura alta e robusta, descalça, dançava loucamente com dois gravetos em mãos. As velas vermelhas e azuis que haviam sido espalhadas em círculos na areia lutavam para se manterem acessas conforme a brisa noturna viajava pela ilha; Malaquias estava tentando replicar as ações repetidas pela pequena onça da estória, sempre parando em algum momento tentando consertar algum movimento que estivesse errado.


Se sua 'vovó' estivesse neste exato momento na praia acharia que o homem havia enlouquecido, mas não se surpreenderia. Malaquias, mesmo que já fosse um adulto,  era muito bobo—para não dizer burro— e provavelmente teria levado sério demais a estória contada então  acabaria por tentar  o distrair para que ele parasse antes de se  machucar.


Ao terminar o ritual, o homem havia ido ao encontro do monstro.


Depois de longas horas de procura sem sucesso, ele começou a se desesperar.


"A minha chance, ela se foi?" Malaquias olhou confuso ao redor, não aceitando suas próprias palavras.


 Talvez eu tenha demorado demais? E se o mar acabou levando ela para longe? Ele então cogitou a ideia de que o monstro talvez tenha ido em direção a vila.


Aquela coisa gosmento? Parece mais uma lesma, demoraria mil anos para chegar lá!  


Hahaha...


Chegando em sua cabana, frustrado, Malaquias sem se importar em tirar as roupas sujas de seu corpo ou sequer se lavar para amenizar o calor, ele simplesmente se jogou em sua cama se forçando a dormir. 


Ainda era cedo e demorou alguns minutos para que enfim o sono batesse, mesmo que de leve em seus olhos.


Estando prestes a cair, Malaquias se virou de lado, mas quando estava quase a adentrar em um mundo imaginário de pesadelos—ou de sonhos incertos—sua porta foi violentada com uma série de batidas.


TOC.. TOC.. TOC.. TOC..!!


Alerta, Malaquias levantou de imediato ficando sentado na cama, mas assim que colocou o pé no chão a porta se abriu em um baque.


Seus olhos duplicaram de tamanho e sua boca se abriu em um 'O'.


Pela sua porta, uma criatura gosmenta entrou em sua cabana.


ERA O MONSTRO!! 


Malaquias como um raio se apressou a pegar seu machado que descansava ao seu lado, pregado na parede.


Mas antes que pudesse disparar em um golpe fatal, ele pôde escutar uma voz; demorou alguns instantes antes que o homem com o machado pudesse perceber que a voz não vinha de algum visitante noturno da vila em mais uma aventura de insultos, mas sim o monstro gosmento que começara a falar:


"Você me chutou, seu caipira maldito—"


Sem antes lhe dar qualquer chance de comentar sobre o que havia acontecido, a criatura caiu dura no chão como um pesado saco de farinha o assustando com o baque e lhe deixando totalmente confuso. 



Monstros marinhos, bestas ferozes do fundo dos mares era algo bastante comentado em dias de Tempestade, mas em nenhum momento foi comentado que elas falavam.


Sereias, com certeza sereias falam! Mas isso está longe de ser uma sereia...ou será que eu escutei a descrição de maneira errada?


Aish, que confusão!


Agachado ao lado do monstro, Malaquias  como uma criança que havia acabado de encontrar um bicho morto, o cutucou com um pedaço de madeira algumas vezes.


A cabana que estava sendo a todo momento banhada pela luz do luar, era a única coisa que permitia com que o rapaz observasse a criatura.


"Seu Monstro...Você está morto?" E continuou a cutucar.


"Se você pode falar, acho que esse seria um bom momento para começar. Eu estava prestes a matar você, Seu Monstro..." Sem respostas.


O monstro que permanecia em silêncio, subitamente começou a derreter…?


A gosma amarelada que encobria todo o seu corpo começou a se espalhar pelo chão da cabana, sujando os joelhos e calças de Malaquias. 


Quando percebeu, toda aquela camada havia se dissipado. O que antes era um monstro gosmento parado como uma pedra havia deixado para trás um corpo humano duro como um cadáver.

"Porra."


Malaquias exclamou e sem pensar muito no que havia acontecido, já estava jogado no corpo preocupado.


"Ei, ei...o que aconteceu com você? Você está bem?" Malaquias perguntava rapidamente enquanto virava o corpo inconsciente. 


A Ilha Verde é uma das poucas ilhas do Segundo Piso onde se é possível notar a perceptível  coexistência entre natureza e homem, e também a sua quase total ignorância sobre o restante do Piso.


Ela se localiza em algum lugar distante, sendo a única faixa de terra visível em uma extensa camada de água sem fim. Isolada, muitos de seus habitantes sequer cogitaram a existência de algo além do mar.


O que existia era a Grande Floresta das Árvores de Pilar, O Grande Mar e o Rio do Céu.


E só.


Eles poderiam ser considerados como pessoas muito acomodadas e que não costumam gostar de mudanças, sendo assim muito tradicionais e ritualísticos; se você nascesse um pescador, morreria um pescador. 


E por serem quem são, muito pouco sabiam sobre o que não era comum. Por não serem pessoas curiosas, muitas delas sequer se atrevem a atravessar a Grande Floresta, permanecendo alheias ao seu redor.


As pessoas das vilas vizinhas—as únicas conhecidas— se assemelhavam bastante entre si em questão de aparência, então qualquer coisa fora do padrão já existente era extremamente raro. Muitos deles possuíam  peles avermelhadas e brilhantes, raramente se incomodavam com o sol. Seus cabelos eram castanhos e ondulados;as pessoas da Vila de Pescadores tinham o costume de os mantê-los no tamanho dos ombros, mas ele já havia visto em algumas outras vilas que eles os mantêm trançados e amarrados, ou extremamente curtos.


Mas a pessoa à sua frente era extremamente diferente. 


Malaquias sempre foi apontado como estranho, ele sabia que era; sua pele era tão clara que quando ficava tempo demais ao sol e sem seu chapéu, sua pele ficava rosa e começava a queimar. E seu corpo vinha sendo coberto de pêlos desde muito jovem, então começou  a  retirar a cada dois dias sua barba que insistia em crescer. 


E seu cabelo, era o que ele mais odiava. Já não bastava ser chamado de Palha 'Queimada', entre seus fios castanhos vários outros como fogo entupiam a cabeça do homem em cachos bagunçados. 


As crianças costumavam o comparar a uma lagarta de fogo por causa de seus pêlos alaranjados. 


Malaquias aproximou seu rosto do outro. Para seu alívio, mesmo que fracamente, ele ainda respirava.


"De onde você veio, garoto?" Ele perguntou enquanto limpava o restante de gosma do corpo que repousava em seu colo.


No primeiro momento em que o faz-tudo observou o rapaz inconsciente ele já havia notado que não se tratava de alguém da Vila e se fosse chutar algo ele duvidaria  muito ser de outras da ilha. Nada existe além do mar...talvez ele seja algum tipo de… divindade?!


Malaquias abriu a boca surpreso com sua própria suposição, se preparando mentalmente para se jogar aos chão e implorar por perdão por todos os seus insultos ao mar .


Eu não sabia, eu realmente não sabia!


Enquanto o limpava, sem querer um pouco da substância viscosa, correu em direção a sua boca.


Malaquias por reflexo quis vomitar, mas assim que percebeu seus dedos apertaram sua camiseta.


"Mel?" O doce sabor se espalhou pela boca de Malaquias, o surpreendendo. Ele nunca pensou que se tratava de mel e se perguntou o porquê do rapaz/divindade estar coberto da cabeça aos pés de tal substância.


Malaquias olhou para o rapaz/divindade, e ficou preocupado com alguns pensamentos estranhos que lhe passavam na cabeça.


Era como se de repente suas papilas gustativas tivessem se aberto para uma explosão de doçura...era como se uma estranha excitação se apossasse de seu corpo.


"Nossa…" sussurrou.


Ele sentiu sua boca salivar e seu corpo formigar.


Mesmo tentando fortemente ele não havia conseguido  se conter, e levou seu dedo indicador em direção ao rosto retirando uma boa quantidade do mel, o levando a sua boca a seguir sentindo novamente a doçura.


Seus olhos acenderam e suas pupilas dilataram.


"É realmente mel!" Ele piscou " Eu não experimento mel desde...desde...desde quando arranquei aquela colmeia quando era pequeno!"


Isso…isso é delicioso…!!


O homem esfregou os dedos nervosamente enquanto cogitava uma ideia e evitava uma ação.



"Me desculpe...eu não sou nenhum tipo de pervertido, eu só…" Sua respiração ficou pesada, e sua voz saiu ofegante. Era uma sensação estranha e Malaquias não estava gostando nenhum pouco do efeito que estava causando em si.


Involuntariamente, Malaquias estendeu a mão para a passar por completo no corpo a fim de retirar  o mel, mas quando seus dedos tocaram suavemente o peito alheio ele sentiu uma forte dor em seu estômago e caiu para trás.


Ele havia acabado de receber um forte golpe; um soco vindo do corpo inconsciente.


"Ouse por suas mãos sujas em mim novamente, e não lhe restará mais mão nenhuma em seu braço, caipira de merda!" 


Seus olhos se arregalaram de imediato. Ele havia acordado? 


"Você me chuta e depois quer passar a mão em meu corpo inconsciente…" ele se sentou no chão, enquanto retirava com desgosto o mel de seu rosto o jogando rapidamente no chão. Ele olhou com repulsa para Malaquias, quase como se estivesse prestes a cuspir em sua cara: "...Ainda se diz não ser um pervertido. Se não é um pervertido, talvez seja um mentiroso?"


Malaquias se mantinha estático no chão tremendo pela dor, ofegante ele olhou o rapaz que se levantara, começando a vasculhar a cabana calmamente enquanto se apoiava nos poucos móveis que possuía.


"Não se preocupe, o efeito do mel irá passar rapidamente, ele é mais forte quando o que tem que acontecer  acontece.." comentou enquanto andava.


"Onde é este lugar?" Perguntou para o homem no chão, que não lhe deu nenhuma resposta. Uma expressão impaciente se apossou de seu rosto e fez com que se perguntasse se o homem talvez fosse muito burro.


Ele resolveu usar isso a seu favor.


"Você por acaso sabe como vim parar aqui? Eu não pretendo ocupar sua mente lerda com pensamentos, mas eu não consigo...me lembrar direito das coisas" um sorriso de canto comum em trapaceiros surgiu em sua face.


Esse homem parece ter gostado de mim, como não, sou muito atraente; se eu me esforçar talvez ele ceda e deixe com que me esconda aqui —seja lá onde aqui seja.


Ele olhou para  a janela.


"Tenho quase certeza que cai de algum lugar...ah—" o confuso rapaz em algum momento começou a apertar fortemente sua cabeça, ficando de joelhos no chão sujo. "C-como dói…"


Ele tinha decidido que iria fingir desmaiar e se fazer de coitado a fim de instigar o lado piedoso do homem, mas não esperava que no fim sentiria dor de verdade.


Por ter sido o principal afetado pelo mel e por ter sido exposto por mais tempo a ele (e em quantidades absurdas), o efeito estava o pegando de jeito. 


O que tinha que acontecer, tem que acontecer. 


E foi por esse motivo e muitos outros pelo qual o rapaz havia fugido. Ele não queria ter caído, mas ser forçado a fazer esse tipo de coisa com alguém desconhecido é fora de cogitação. 


Seu corpo havia começado a formigar e a esquentar. Só era necessário mais uma ação para que acontecesse, e caso não fosse possível o ato seu corpo acarretaria com as consequências.


E ele estava disposto a suportar toda a dor se isso significasse não ter que fazer.


Malaquias que estava em transe, rapidamente se levantou escorregando algumas vezes no chão. 


O garoto insistia em se recusar a aceitar a ajuda de um velhote pervertido, se esquivando das mãos alheias.


"N-Não me toque, seu tarado!"


"Eu não sou tarado, já disse! Eu só estava tentando pegar...aish, eu só tô tentando te ajudar."


"Se você quiser me ajudar, primeiro não me toq—" seu corpo estremeceu quando o homem tocou seu ombro, como se uma forte corrente passasse por si queimando onde o havia tocado.


Ele se enojou. 


Tinha nojo dos costumes de seu povo.


Mesmo com a resistência do garoto, Malaquias conseguiu o colocar em sua cama assim que o rapaz caiu duro novamente em seus braços não acordando mais naquela noite e nem nas três noites que se seguiram . Sua respiração era pesada e sua pele estava esquentando.


Seja lá o que estivesse causando essa reação, Malaquias não tinha certeza se poderia ser útil. 


Mas faria tudo ao seu alcance para o ajudar—e se livrar de uma provável maldição.


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PLP